Claro que que o cronista, que analisa temas políticos neste espaço, não deveria falar em tragédias que a natureza provoca. No caso específico, como deixar de registrar a tragédia do Sul do estado, atingindo mais frontalmente a cidade de Mimoso do Sul. Aliás, ela ficou bem perto de nós, cachoeirenses, como a elevação de mais de três metros do rio Itapemirim. É muita tristeza para começar o ano.
Contrapondo a isso - e trazendo alento - o que se destaca é a solidariedade dos capixabas. Passei por muitas situações semelhantes durante a vida, sobretudo no período no qual me meti na vida pública. Porém, quando tudo volta ao normal - nem sei se é normal - ficamos esperando a próxima tragédia, achando que ela não vai acontecer. Até que que um dia, chegam as águas.
Escrevi na Revista Leia que o problema maior é que as cidades carecem de planejamento. E quando as águas das chuvas chegam, não se sabe o que fazer senão prestar solidariedade. Ou correr atrás dos efeitos e não das causas. Que é o caso agora.
Quando se perguntava a Jaime Lerner, então prefeito de Curitiba, o que é uma cidade é boa, ele dizia que é quando ela é boa para seus habitantes. Dizia que é a cidade que considera a universalidade do respeito à escala humana, que tem senso de justiça social, que dá dignidade e sustentabilidade à vida das pessoas por meio do trabalhar, do morar, do viver e do construir sua história.
Beleza. Mas e aí? Sintetizando, diria que o planejamento urbano é o seu instrumento de transformação. Sempre defendi a tese - e nunca me deram bola - que a Secretaria de Planejamento nunca deveria ser um apêndice da administração, cujo titular o mandatário nomeia, para um cargo em comissão. Deveria ser um organismo permanente, planejamento a cidade o tempo todo. Só assim evitaríamos que obras não fossem realizadas ao sabor das conveniências políticas.
Você quer um exemplo? O Victor Coelho, prefeito de Cachoeiro, só está realizando essas obras de macrodrenagem - fundamentais para evitar os desastres - porque tem muita coragem. Elas, obras, embora fundamentais para corrigir erros da falta de planejamento - incomodam e causam transtornos até que sejam concluídas. Mas corrigem erros do passado por falta de planejamento. Os prefeitos não as realizam porque, depois de pronta, ficam escondidas e, em tese, não dão voto.
Cachoeiro, por exemplo, na próxima administração, vai precisar, urgentemente, de um Plano Diretor Urbano. Qual é seria o principal objetivo do Plano Diretor? Elaborado com a participação da sociedade, é um pacto social que define os instrumentos de planejamento urbano para reorganizar os espaços da cidade e garantir a melhoria da qualidade de vida da população.
O prefeito Victor, em suas viagens a outros países, constatou isso. A propósito, Lerner já dizia, no passado -reconhecido em todo o mundo - que entre as diretrizes do Plano Diretor estão justiça social, melhoria da qualidade de vida da população, uso racional dos recursos do meio ambiente e participação social nas decisões do futuro das cidades.
Quando esteve em Cachoeiro, Lerner asseverou, enfaticamente, que nossa cidade era "um grande desafio". E é. O futuro prefeito ou prefeita vai precisar, sobretudo, convocar a população a participar do processo e integrar-se nele - e isso é a verdadeira participação. Caso contrário, terá correr atrás dos governos - federal e estadual - para realizar obras, por exemplo, como a da macrodrenagem, que está quase em seu final, para evitar que tragédias aconteçam, como estamos assistindo, agora, em Mimoso do Sul e município vizinhos.
Victor, como sua experiência, poderá ser um grande aliado.