Crônicas
Amizades quebradiças
2022-08-22 17:47:34

Nós que ainda somos sobreviventes da pandemia e da guerra, mas nem por isso deixamos de sofrer. São ansiedades, tristezas, enfim.  E as amizades – sinceras – fazem uma falta incrível.  Li, domingo, uma crônica da jornalista Dorrit Hazarin que me emocionou.  Diz ela que “muito antes de o bicho homem tomar rumo semelhante, os animais já se aglomeravam em grupos mais amplos do que as famílias biológicas a que pertenciam. Fizeram bem, pois assim alongaram seu tempo de sobrevivência no planeta. A natureza das espécies foi generosa também com o ser humano, pois foi desse mesmo instinto de sobrevivência que deve ter emergido algo tão monumental e fugidio a definições como a amizade”.
 Diz mais num texto tão irretocável que tenho até medo de interferir: “Melhor nem pretender descrevê-la e recorrer logo a um desses filósofos da Antiguidade que sabiam pensar e escrever sobre tudo. Certo estava Sêneca quando escreveu que a amizade é um talento. E, como todo talento, um dom. Orlando Brito, o mais completo repórter fotográfico brasileiro, tinha esse dom. Foi meu amigo. O verbo no pretérito perfeito dói”.
   Sem fugir do tema, numa invejável prova de amor ao amigo Orlando Brito, que se foi aos 72 anos, diz a cronista, que é mulher do também brilhante jornalista, Élio Gaspari: “voltando ao tema inicial da amizade, essa coisa que é tanto elo quanto sentimento, abstração e matéria. Que pode nascer no instante em que alguém diz para o outro ‘nossa, você também? pensei que só eu...” e durar por uma vida inteira. Mais: “Amizade já foi considerada como superior à paixão por ser menos conturbada, concentrar menos exigências ou ansiedades capazes de perturbar a tranquilidade do fluir das ideias. A dádiva de ter amigos é outra — é a possibilidade de falar e de ouvir sem defesas, é nossa válvula de segurança. Amigos dizem o que devemos ouvir, na hora certa. Amores, na maioria das vezes, dizem o que queremos ouvir”.
  E arremata com aquilo que todos precisamos saber: “Pois, ao longo da vida, Orlando Brito entendeu o poder e a complexidade da amizade. Regava cada uma com o respeito, a distância ou a aproximação que sua sensibilidade afetiva ditava. Não brigava, quando necessário deixava amizades quebradiças morrerem de morte natural.”. Obrigado, Dorrit. Obrigado, Brito.

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