Cada ano que passa você enxerga a vida de uma forma. No passado, confesso, já fui a favor da reeleição. Achava que se o mandatário que ia bem, que estava governando corretamente, merecia ser reeleito. Hoje não penso mais assim. E não é só por causa do Bolsonaro. A grande verdade, e nesse ponto Élio Gaspari tem razão, a máquina da política brasileira não rateia por causa do presidencialismo, mas pela possibilidade da reeleição. Ela transforma presidentes, governadores e prefeitos em mandatários que assumem as funções obcecados pela recondução. Mas a palavra certa é esta: obcecado. Bolsonaro, por exemplo, não está preocupado só com a pandemia ou desemprego ou inflação. Está doente porque sua popularidade está despencando, as pesquisas mostram isso, e fatalmente não vai conseguir a reeleição. Ou seja: tudo isso porque está obcecado pela reeleição. Acho que o argumento é bom para ter mudado de ideia. Sou contra a reeleição. Explico a minha mudança de ideia e o faço bem acompanhado. Em sua autobiografia, Fernando Henrique Cardoso, que sempre foi uma pessoa muito vaidosa, reconheceu que, historicamente, cometeu um erro: lutou pela reeleição. E venceu. Ele dizia não querê-la e, querendo-a, criou-a. Tanto Lula como Bolsonaro combateram a ideia da reeleição. Sentindo o quentinho da faixa, mudaram de ideia. Em verdade me ensina um velho político: “É o ser humano!”. Frase idolatrada por um psiquiatra amigo meu. Aliás, a vaidade é irmã gêmea da inveja, pensou eu. O ódio espuma. A preguiça se derrama. A gula engorda. A avareza acumula. A luxúria se oferece. O orgulho brilha. Só a inveja se esconde. Mas aparece. Como agora com o semipresidencialismo.
O quentinho da faixa de presidente anima Fernando Henrique, Lula, Bolsonaro. Por isso e por tudo que aconteceu e acontece, sou hoje contra a reeleição. Aliás, o responsável pela reeleição foram os tucanos, como disse. Foram os responsáveis por uma espécie de envenenamento do regime presidencialista. Mais ou menos com a história de semipresidencialismo. Por trás disso há um golpe. É uma farsa dizer que o semipresidencialismo limitaria os poderes de Bolsonaro num eventual segundo mandato. Aliás, é um golpe e golpe de quinta categoria. Se Bolsonaro for reeleito, ele vai triturar o regime. Aliás, como tenta fazer todos os dias. Não se pode cair na retórica de um argumento desses. A história do regime francês, que poderia ser aplicado aqui, é uma balela. O semipresidencialismo, na verdade, é um golpe articulado para as próximas eleições visando a salvar Bolsonaro. Coisa que acho quase impossível.