Estou me preparando para escrever o terceiro livro de Fotocrônicas, com personagens cachoeirenses que marcaram a minha vida. É uma encomenda da Editora Leia. Vou doar o que eventualmente for arrecadado para a Casa do Câncer, mais uma vez. Desde o falecimento de minha mãe, em 2002, tenho feito isso. Recebo, permanentemente, pedidos dos livros editados de cachoeirenses que moram fora, mas as edições estão esgotadas. Perdi até um amigo, por sinal muito querido, que achou que não mandei o livro por esquecimento, desleixo ou falta de consideração. Não, não foi. Prometo que, como muita honra, remeterei o próximo. Há cenas curiosas que tenho guardado em meu coração, na minha lembrança e no meu patrimônio afetivo.
Fui, antes da pandemia, ao sepultamento de um ex-craque do Estrela. Famoso, encheu de alegria as tardes de domingo em Sumaré. Devemos a ele esses dias que suavizam as nossas dores e exaltam nossa paixão. Como devemos a Sumaré a poesia do velho cronista: “Revejo, com saudade, as bandeiras das tuas batalhas repartidas sobre o campo. Revejo, com saudade, a tua multidão que torce e distorce a verdade até morrer, doa a quem doer. Revejo, com saudade, as esperanças que se perdiam pela linha de fundo no entardecer de cada jogo. Quantas vezes foste a minha pátria amada, idolatrada, salve, salve.”
Pois bem. Ia dizendo que uma cena no sepultamento suavizou o meu coração. Em determinando momento, com seu jeito espalhafatoso, Dequinha chega e se aproxima do caixão. Num gesto doce e emocionado cobre suavemente o corpo do craque com uma imensa bandeira do Estrela. As pessoas se levantaram cerimoniosamente em respeito ao gesto de amor e reconhecimento. Alguém, ao meu lado, comenta suavemente: “Todo jogador do Estrela que morre, ele faz o mesmo. A bandeira do Estrela cobre, senão de aplauso, mas amor de reconhecimento do torcedor”. Deve ser por isso que o poeta diz que no futebol, matar a bola é um ato de amor.