O velho bruxo argentino dizia que, como todas as coisas, o destino de Pedro Salvadores parece-nos um símbolo de algo que estamos a ponto de compreender. Minha adolescência foi sob o jugo de total falta de liberdade de imprensa. Mas hoje é diferente, graças a Deus. Temos uma imprensa que ainda resiste. Aliás, “não cala a boca”. Bolsonaro tem pressa. Esta semana ele nomeou o novo diretor da Polícia Federal, que assume com a missão de proteger pai e filhos. A operação incluiu edição extra do Diário Oficial e posse relâmpago a portas fechadas. Cenas de um governo acuado, que vê na radicalização a única saída para se segurar no poder.
Grandes artistas têm o dom de resumir o espírito do tempo. Aldir Blanc narrou uma conversa com seu velho parceiro: “Recebi um telefonema do João Bosco. Triste, João falou sobre o ódio alucinado que grassa no país: ‘Clamam por sangue, querem enforcar, pedem a volta da ditadura, só um lado é preso. E há um ódio em tudo. Sinto a mesma coisa”.
Sem qualquer paixão política, não estou na idade de arrebatamentos, quero dizer que é preciso dar limite ao presidente Bolsonaro, ou ele vai tentar um golpe. Está sem controle sobre si mesmo e sobre a situação. Se mostra despreparado para conduzir o cargo de presidente da República, não tem noção do que sejam instituições, nem separação de poderes e o papel de cada um. Não admite que o STF tenha a palavra final, mas tem. E não há como fazer diferente, a não ser dando golpe. Ele está constrangendo os poderes que o limitam.
O velho guerreiro, hoje homem maduro, diz que quando escrevermos a história da passagem dessa peste pelo Brasil, não poderemos esquecer que ela foi politizada, tratada como um vírus comunista, e uma nuvem de suspeição se ergueu contra os que queriam combatê-la de frente. Com um tempo e alguma pesquisa, talvez possamos estabelecer um paralelo com a chegada dos colonizadores ao continente. Um conjunto de mitos impediu que fossem vistos na sua dimensão real. E isso precipitou a ruína das civilizações aqui existentes.