Wilson Márcio Depes
Começo a improvisar um balanço pessoal do que aconteceu este ano. Mas resisto a fazê-lo publicamente. Passei a ter horror dessas resenhas e retrospectivas de final de ano, onde aparecem tragédias e pessoas que desfalcaram nosso time aqui na terra. Tenho lido menos do que gostaria. Mas, a cada dia, constato, de forma intrigante, como continua atual nosso Guimarães Rosa: “O importante e bonito do mundo é isso: que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas, mas que elas vão sempre mudando. Afinam e desafinam”. Paro e penso. Vejo, por exemplo, como o meu amigo Sérgio Bermudes continua atual, o advogado mais brilhante deste país, o amigo insuperável, intelectual refinado e o cachoeirense que ama diariamente a sua terra. E quando fala de Cachoeiro a gente vê em seu rosto aquilo que o poeta Senghor chama de “E senti sobre meu rosto o leite fresco da verdade”. A mesma verdade que vi na emoção de Roberto Carlos, quando da janela Hotel San Carlo, me chamou num canto e disse: “Esse rio magricela não tem nada, mas todos os dias eu me lembro dele com imensa saudade. Uma saudade que me dói.”. Acabei falando de meu Cachoeiro. Teria razão o velho Braga quando vociferava que “tenho uma solidão muito cheia”? Ou seja, “penso em Cachoeiro o dia inteiro”. Desse modo, “sinto-me mais sozinho quando estou acompanhado”. O velho Braga, tanto quanto um mestre que me ensinou as primeiras letras no Direito, tinha horror aos adjetivos. Dizia que as coisas trazem, dentro de si, suas qualidades – estáveis e maciças como os frutos de uma árvore – e não precisam de adornos, nem simulacros para se definirem. O mistério do mundo não está em seus ornamentos; ao contrário, é encoberto por eles. Portanto, ao dizer “Que bela manhã!” ou “Que linda manhã!”, ele dizia: “Que manhã!”. Acabo o ano consciente de que Cachoeiro possui mesmo um fascínio, pelo menos na visão dos ausentes. Ou, como dizia o velho João Madureira, é melhor ser cachoeirense ausente que presente."